"À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo"

Categoria: Reflexões (Page 1 of 15)

Retalhos

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Tem um tempo que eu venho refletindo muito sobre, bem, sobre tudo. E não, não é uma figura de linguagem. E eu não sei se cheguei a algum lugar (nem se é possível chegar em algum lugar), mas eu precisava fazer algo com tudo isso – nem que fosse um post desconexo no meu blog.

Acredito que dentro da nossa cabeça exista um “Eu Ideal“. Esse Eu é uma espécie de junção de experiências e de características que a gente vê por aí e entende que são boas pra nós. Conforme a gente vai criando esse Eu, naturalmente, começa a tentar buscá-lo. Só que a vida real é ligeiramente avessa a idealismos e, mais do que frequentemente, a gente vai ficando longe dele.

E é aí que o bicho pega.

Pega porque a gente tem que tomar decisões que enderecem problemas da vida real, não da ideal. E por mais que isso faça perfeito sentido, pra nossa alma sonhadora é uma espécie de traição; é como se você arrancasse um retalho da enorme colcha que são nossos sonhos e vontades. Em geral, no calor do momento, isso passa batido… mas volta, sempre volta. Um dia você está deitado na sua cama, tarde da noite, esperando o sono bater mas o que bate mesmo é a lembrança daquele seu Eu que queria ser alguma coisa bem diferente do que você, de fato, é hoje. E, roubando do Camus, é aí que os cenários desabam.

Isso não seria um problema se a gente fosse melhor em aceitar que as coisas mudam, ou que a vida pede decisões diferentes das que a gente gostaria de tomar. Quando a fazemos terapia é meio que isso que, 50 minutos por sessão, buscamos desvendar, organizar, entender e, finalmente, aceitar. No entanto, tomando a mim como exemplo, parece-me que temos um mecanismo de tentar costurar esse retalho de volta – mas a gente esquece que o buraco deixado pelo retalho rasgado outrora aumenta dia após dia e que um remendo não resolve.

É quando a gente se olha no espelho e vê… buracos. O músico, o atleta, o escritor, o menino, todos eles deram lugar a alguma outra coisa (ou só deixaram espaços abertos mesmo). São muitos retalhos pra colocar de volta e, sendo honesto, não sei se tem muito como. Como dizem, “o trem já saiu da estação”. E é aqui que talvez seja o erro crasso dessa coisa toda (e eu sigo tentando entender, não ache que eu sei qualquer resposta).

A solução desse problemão todo não é remendar rasgos, mas começar uma colcha nova que leve em consideração que a vida é uma coisa em constante movimento que só obedece às suas próprias leis e meio que, perdoem o meu Francês, caga um balde pro que a gente acha. Essa colcha, inclusive, não possuirá todos os retalhos que você gostaria que ela possuísse, nem as cores que você mais gosta, afinal, ela começa a ser preenchida com os pedacinhos de pano e linha que você tem hoje – e não os que você tinha quando sua maior preocupação era uma espinha na ponta do nariz.

Mas não, não é fácil. De novo: a gente parece ter um mecanismo que, de alguma maneira, faz a gente acreditar que querer começar a tricotar de novo é errado e, pior, não vale a pena. Que “it is what it is” e que devemos nos contentar com o que a gente tem, já que é o resultado de escolhas e decisões feitas por, veja bem, nós mesmos. Assim, vamos ficando cada vez mais frustrados e absortos em devaneios do que poderia ter sido e não fui.

Eu tou nesse lugar tem anos e é pesado. Fica mais pesado ainda quando, por um capricho dos deuses, a gente é capaz de enxergar as letrinhas por trás da Matrix (salve, Cris Dias). Portanto, escrevo essas palavras como uma tentativa de dizer pra mim mesmo que é possível um caminho diferente, desde que eu não queira voltar o tempo, o que normalmente é meu primeiro impulso. Eu sou um Alê fundamentalmente diferente do Alê sonhador de 20 e tantos anos atrás (ainda bem) e, embora compartilhe de muitos dos mesmos sonhos, tenho uma vida estabelecida, com responsabilidades, funções e restrições que precisam ser levados em conta.

A pergunta que fica no fim disso tudo é: “o que eu quero fazer com meus panos e minhas linhas“?

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2023 razões

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Faz um tempo exagerado que eu num apareço por aqui e isso se dá por 2023 razões, pelo menos. Sim, 2023 foi um ano… bem, foi um ano.

Eu gostaria de terminar esse ano fazendo o que, um dia, eu fiz de melhor – escrever o que eu penso, sinto e espero, sobretudo pro ano que chega. No entanto, eu honestamente acho que dessa vez não vai ser possível.

Quem me conhece de perto sabe que eu preciso do que eu chamo de chacoalhões para conseguir fazer com que as coisas andem, isso em qualquer aspecto da vida – e não faltaram nesse ano do Senhor; eu ainda não sei se as coisas estão andando, mas certamente elas não estão paradas.

A vida tem um jeito muito particular de nos mostrar as coisas, de nos entregar questões e esperar pra ver como vamos endereçá-las. Eu, confesso, nunca fui muito bom nisso, até porque quando se trata de mim eu sempre me esqueço. Como diz aquele ditado, ou frase, que vemos em um filme ou outro, “meu coração está no lugar certo” – mas isso nem sempre é o suficiente. E eu sei.

Esse ano, como nunca antes na história desse que vos escreve, basicamente todos os aspectos da minha vida meio que passaram por um liquidificador e, confesso, foi extremamente assustador – talvez porque eu me olhei no espelho por mais vezes do que eu gostaria.

Não estou dizendo, no entanto, que não houve coisas boas, conquistas ou esperança – claro que houve! Mas o fato é que eu me vi olhando mais vezes pro abismo do que pro espelho e quase torcendo pra que ele olhasse de volta pra mim, além de me dar ideias do que fazer pra andar pra frente sem cair nele. Esse abismo chamado 2023 me colocou contra a parede muitas, muitas vezes… e eu confesso que saí dela poucas. Mas acho que estou começando a entender essa dinâmica.

Em 2024 não espero um completo 360º, até porque não é assim que a vida funciona, mas eu preciso procurar aqui dentro o Alê que um dia existiu. Eu sinceramente nem sei com o que, de fato, ele se parece; ele sempre foi um coletivo de vontades, desejos, sonhos e apostas meio incoerentes e incompletas. Mas eu acho que eu sei o que eu gostaria que ele fosse, então acho que tenho um ponto de partida.

A todos que lêem essas palavras, gostaria de agradecer, primeiramente, por estarem lendo até aqui, mas também pela companhia, conselhos e ouvidos – tenho certeza que alguma dessas coisas vocês fizeram por mim. Gostaria, também, de pedir desculpas pelo meus momentos de grosseria, chatice, intransigência e por decepcionar vez ou outra. Garanto, do fundo do meu coração, que nunca foi minha intenção.

E à minha filha, Bárbara, que um dia espero ler as bobagens que eu escrevo: você é tudo e um pouco mais pra mim. Obrigado por dizer que me ama toda vez que você sente vontade e por sorrir toda vez que me vê. Papai ama muito você, Babi.

Que venham novos ventos.

Obrigado e até ano que vem, amigos.

Shadows on the road behind
Shadows on the road ahead
Nothing can stop you now” – Ghost Rider, Rush

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Never Turn Your Back on Friends

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Nota do Alê: Esse texto foi escrito em 2016… até hoje não sei por qual razão não o publiquei.

Nostalgia e saudade são coisas engraçadas. É tipo dor de barriga: vem na hora que você menos espera.

Estava eu trabalhando ~alegremente~ quando me bateu aquela baita vontade de ouvir Blind Guardian. Mas eu não queria ouvir qualquer coisa: queria ouvir MIRROR MIRROR. O Blind é uma banda que, em um período da minha vida, eu achava uma porcaria. Rebeldia vazia e poser de adolescente, sabe? Até que um dia fui chamado pelo meu irmão André Colin pra tocar na banda dele, que por coincidência, era a mesma banda dos veteranos metaleiros lá na ETELG.

Sim, metal. Segundo números do Instituto Data-Fodase, 72,36% dos adolescentes que têm banda, têm banda de metal; e, no repertório que eu tinha que tirar pro primeiro ensaio, entre Megadeths e Helloweens, lá estava: Blind Guardian – Mirror Mirror. Dei uma torcidinha de nariz, mas, porra, eu ia entrar numa banda de metal! Vamos lá tirar o som…

Na primeira ouvida, pirei na música. Porradaria, guitarras frenéticas, bumbo duplo, Tolkien, doideira. Já era: eu tava gostando de Blind. Só que essa música (e o Nightfall In The Middle Earth) ganhava um lugarzinho no meu coração. E só ia aumentar nossa relação headbanger dali em diante.

Em 2003, fomos convidados para um festival de bandas em Okinawa (não no Japão – num clube em Diadema mesmo). Estávamos super empolgados, pois tínhamos um set matador, o melhor baterista do mundo (caralho André, que saudade), uma comanda com uma boa quantidade consumível de álcool, caras de mau e camisas pretas. Na hora de Mirror Mirror, quebra o pedal duplo do André… Meu Deus e agora?? Pro nosso delírio, e da galera, o André puxa o microfone e diz: “aí, meu pedal duplo quebrou. Mas foda-se: vamos tocar Mirror Mirror pra vocês“. Lembro como se fosse ontem. A gente tocou a música mais rapidamente que o normal (o que deixava a música, que é treta de tudo na batera, mais embaçada ainda), mas – com toda a modéstia do mundo à parte – arregaçamos, em especial o André; eu lembro de ver a galera lá embaixo se matando e nós, em cima do palco, em êxtase. Praticamente celebrávamos nossa amizade naquele dia de maneira grandiosa num dos que foi um de nossos melhores shows – e numa Mirror Mirror violenta.

Mas, 2 anos depois, veio aquela voadora seca do destino, que quis que perdêssemos o convívio de nosso amigo André. O cara que, era o espírito elevado daquela banda; o meu irmão postiço que passava horas e horas comigo, sentado nas escadas da ETELG, cantando os instrumentais dos sons que gostávamos. O cara que simboliza pra mim como a simplicidade e o respeito são as duas características mais importantes e nobres que o ser-humando pode ter. Alguém que faz uma falta desgraçada nesse mundo egoísta e primitivo.

Mas, na real? Ele ainda está por aqui e eu tenho certeza que é ele que sopra essa nostalgia musical na minha alma vez ou outra; eu tenho certeza que é ele que mantém o laço apertado entre todos nós há tanto tempo. E eu tenho um orgulho do caralho de ter tocado esse som com esses caras e de poder dizer que eu conheço, convivo e toco com esses caras até hoje.

A vida é curta, meus amigos. Mais do que a gente imagina. Não perca tempo reclamando de pequenices, absorva tudo de bom que está aí pra ser absorvido e compartilhe isso com as pessoas que você ama.

(…)
How shall we leave the lost road

Time’s getting short so follow me
A leader’s task so clearly
To find a path out of the dark

Até logo.

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